terça-feira, 16 de setembro de 2008

Blindness ...

"Penso que não cegámos, penso que estamos cegos, Cegos que vêem, Cegos que vendo, não vêem." ( trecho do livro de José Saramago - Ensaio sobre a Cegueira)

Quem me conhece sabe que sou fissurada nos livros do Saramago. E quem foi meu aluno na Facamp inclusive sofreu as consequências desta fissura, já que eu e Betão, numa disciplina chamada Ilustração, obrigamos nossos alunos a lerem o "Ensaio sobre a Cegueira" (Perguntem pro Alberto, Montoya e Pedrão que eles confirmam!). Nesta disciplina fazíamos os pobres lerem o livro, assitirem ao documentário "Janelas da Alma" e ao filme "Matrix" (foi na época do lançamento do primeiro filme, sem ainda as duas continuações porradaria que se seguiram). Bom, sobre a proposta e resultados destes trabalhos eu certamente falarei outro dia, porque hoje quero falar do mais recente trabalho do Fernando Meirelles, o filme baseado no livro, e que assistimos na sexta feira passada.
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Já vou avisando: não sou crítica de cinema e sou suspeitíssima para falar, já que além de adorar os livros do Saramago (já li 9 deles - por enquanto), também gosto muito do trabalho do Fernando Meirelles. (comprove lendo minha postagem sobre a reação do Saramago ao ver o filme) Isto posto: o filme é sensacional !

É forte como o livro ( é claro que sempre vão haver os xiitas que vão criticar toda adaptação de literatura ... cinema é cinema, livro é livro ... não dá pra ficar naquele bla-bla-blá de qual é melhor, são incomparáveis e ponto final !). A habilidade do diretor foi justamente conseguir transmitir uma estória tão desoladora e escrita de forma tão particular de maneira delicada ( se você leu o livro sabe como os acontecimentos narrados são duros e desnudam o pior lado do ser humano). A direção de cena competentíssima, a incrível e por vezes perturbadora fotografia e o excelente roteiro são complementados pela música belíssima do Uakti (outra paixão antiga) que dá ritmo, pulsação, comove e chacoalha no tempo certo, no tom certo. O elenco é super coeso, com uma Julianne Moore espetacular no papel da mulher do médico (a única que não é contagiada pela cegueira branca).

Pra gente que é de São Paulo, ainda vale a pena pelo registro de uma cidade esvaziada, abandonada e tomada pelo caos causado pela epidemia (temos cenas no Louveira em Higienópolis, no Minhocão, no Teatro Municipal, na periferia e na Ponte Estaiada ainda incompleta, entre outras). É muito bacana ver como a produção retrata esta cidade devastada em espírito, desolada , suja. E é bem interessante também ver como ela é "despersonalizada" (uma das exigências do Saramago era jsutamente que não se identificasse, como no livro, a cidade atingida pela inexplicável epidemia).

Também me impressionou a habilidade da equipe de escapar dos clichês (cá entre nós, se fosse uma adaptação americana comum o filime tinha uma chance enorme de virar um filmão de zumbi no melhor estilo Jorge Romero - porque embora a gente negue, seres humanos em pânico, famintos e abandonados podem ficar bem parecidos com zumbis comedores de cérebro).

Eu confesso, que mesmo conhecendo a estória, fiquei nervosa, ri (pouco) e chorei muito (sim, eu adoro chorar no cinema) ... E o filme tem cenas de uma beleza impossível em meio a tanta desolação e sujeira ( e tem muita sujeira, lixo, mijo, cocô, gente suja e descabelada ... e violência, mas não com escopetas e artilharia pesada, é violência contra a dignidade, a esperança, a solidariedade - e um estupro coletivo em troca de comida deixa isto bem claro).

Enfim, não quero contar o filme todo (embora já tenha contado muito), mas recomendo aos leitores e amigos deste blog que assistam, mesmo que for pra odiar (o que é bem possível). Mas acredito que, na pior das hipóteses, o filme coloca questões que valem a pena ser discutidas, no mínimo faz a gente passar duas horas e pouco pensando em quão frágil é o equilíbrio da nossa tão evoluída sociedade, o quão frágeis e insignificantes podemos ser se abandonados e negligenciados e o quanto podemos também ser cruéis, violentos, egoístas ...


E pra quem quiser saber de opiniões mais profissionais, aqui vão algumas críticas:
omelete 1 omelete 2 almanaque virtual cinema com rapadura

Para mais informações visite o site oficial do filme:

E pra quem se aventurar a assistir o filme, já vou convidando: poste também sua opinião !


E pra finalizar, a citação que abre o livro:

"Se podes olhar, vê. Se poder ver, repara." ( Livro dos Conselhos).
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PS: o primeiro poster deste post é de autoria da concept arts , o segundo é da ignition print ( vale a pena conferir nos links outros trabalhos destes estúdios)

3 comentários:

Marcio Novaes Coelho Jr disse...

Que animal! Só pra deixar com vontade... Mal posso esperar para assistir, preciso descobrir quando estréia em terras germânicas (isso se não passar só dublado em alemão!)... :(

Marcio Novaes Coelho Jr disse...

ps.: o que é esse 1o cartaz?!?
Perfeito!!

Silvio disse...

Bom, acho que este comentário vai sair no nome do silvio, mas foi a dri...
O filme é incrível, sem palavras, daqueles que vc quer matar cada um que faz um comemtário besta no meio. Não sei como pessoas que não leram o livro se sentiram, pois o sofrimento de quando se lê e assiste é semelhante, talvez mais intenso para quem leu o livro. Eu nunca vi uma adaptação tão boa. O melhor de tudo é, sem dúvida, a despersonalização da cidade. Uma rua em SP com placas em inglês, uma no uruguai com placas de trânsito típicas de lá, um consultório na paulista vizinho da marginal... GENIAL!!!!
DRI